Last Updated on 02/12/2022 16:08 by Carlos Silva
Este muro não é um muro!

Tal qual o cachimbo de Magritte, este muro não é só um muro, é todo um universo.
Há muros muito célebres, alguns tristemente célebres como o Muro de Berlim ou o Muro da Cisjordânia! Há muros erguidos para proteger os povos, como a Muralha da China ou a Fortaleza de Elvas. Há muros onde se reza (Muro das Lamentações) ou onde se mata (Execução de Maximiliano de Manet) ou onde se planta, se cuida e se protege, como os muros de basalto negro que preenchem a Paisagem Protegida de Interesse Regional da cultura do Vinho, na Ilha do Pico.
Há muros de pedra e muros de betão; há feios muros de paletes feias; há muros reais e muros imaginários como o Muro que protege a aldeia Chora-Que-Logo-Bebes, na Floresta Branca, cujos habitantes vivem presos à tradição de que tanto se orgulham: chorar de manhã à noite.

E há muros simples, tão simples que receberam o cognome da mais delicada arte feminina – o crochet. Construções singulares que desafiam a lógica e a gravidade. Construções que testemunham séculos de história e a resiliência de um povo. Construções que limitam as pequenas propriedades agrícolas porto-santenses. Com um aspeto rendilhado, onde as pedras com diferentes tamanhos e funções, são empilhadas, sem qualquer elemento ligante, encaixam quase de forma perfeita, por vezes a uma altura superior a um metro.

Levantados por mãos hábeis, calejadas, ao longo de gerações, estendem-se um pouco por toda a Ilha, quilómetros de trabalho duro e paciente, sobretudo nas zonas mais planas, ora de cor negra, ora em tons de amarelo, da cor da pedra disponível no terreno.

Erguidos de forma a deixar alguns espaços, que permitem o arejamento; estes muros servem sobretudo para proteger as vinhas e algumas culturas hortícolas da ação constante dos ventos, promovendo a biodiversidade e evitando a erosão dos solos.

Os “muros de croché” da Ilha do Porto Santo são, por isso, uma manifestação cultural e social. Um testemunho do património construído, da paisagem humanizada e, nas mãos dos novos jovens agricultores porto-santenses, uma mensagem de esperança, que assim, mantém viva a paixão pela terra e recupera a memória de um Povo.