Last Updated on 08/10/2021 09:16 by Carlos Silva

“Porto Santo não é só praia!” – afirmava há tempos um conhecido fotógrafo madeirense.
Miguel Moniz legendava assim uma soberba fotografia da família que, por cenário, tinha a – não menos soberba – imagem da Levada do Pico do Castelo.
Senhora de uma paisagem com uma beleza singular, a Levada do Pico do Castelo proporciona uma panorâmica tanto sobre o planalto central da Ilha e mais longe os Picos do Espigão e de Ana Ferreira, como da extensa linha amarela da praia, ou, na costa noroeste, o mar sem fim. Nas costas do observador, o icónico monte ergue-se, imponente, aos 437 metros de altitude. Este enquadramento fabuloso torna o espaço único; um “Pico Sagrado”, como carinhosamente lhe chama o Professor José Campinho.
Redescoberta em tempos de pandemia por muitos porto-santenses, como espaço de Liberdade e Refúgio, a Levada do Pico do Castelo estende-se, atualmente, ao longo de 3,1 Km, entre a Ribeira do Zimbral, a 160 metros de altitude e o Sítio da Camacha, a uma cota de 120 metros. Uma linha sinuosa, ao longo da encosta do Pico e que integra, por outro lado, uma obra de engenharia muito, muito maior.

Na encosta do Pico do Castelo, inscrita em sangue, suor e muita pedra estende-se uma extensa teia de socalcos, muros de suporte, canais e tanques de retenção. Em torno da antiga chaminé vulcânica foi erguida, afinal, uma gigantesca obra de engenharia hidráulica e florestal pelos nossos antepassados.

Despido pela ação do Homem e da Natureza, o coberto vegetal do Pico do Castelo era, no início do século passado, praticamente inexistente, com grave prejuízo e perigo para a população residente no sopé. A simples utilização de lenha como combustível, nomeadamente na confecção dos alimentos, estava muito condicionada. Impulsionada por Schiappa de Azevedo, desde o início do século XX, a reflorestação do Pico viria a transformar a paisagem árida. Com recurso a plantas exóticas como o cedro ou o pinheiro-de-alepo e também nativas, nomeadamente o dragoeiro e a oliveira, paulatinamente, o solo nu deu lugar à mancha verde que hoje o carateriza. Uma tarefa hercúlea, que exigiu de centenas de trabalhadores, mais ou menos anónimos, um trabalho de preparação/armação dos solos, a construção de pequenos nichos para acolher cada uma das milhares de plantas, como forma de proteção dos ventos constantes e das inundações repentinas.

Hoje, cumprida a sua função inicial, o Pico do Castelo é um pólo de atração turística e espaço de prática desportiva. Mas, caro leitor, quando percorreres estes trilhos rasgados na encosta da montanha, não te esqueças desse trabalho hercúleo, ciclópico, dos nossos antepassados porto-santenses. Seremos, enfim, dignos desse esforço? Seremos dignos de caminhar aos ombros desses gigantes.
(O artigo inicial foi alterado face às informações partilhadas pelo leitor Leonardo Reis que dão conta das primeiras iniciativas de reflorestação, muito anteriores a 1921.
“A 20/10/1907 é referido em diário que o Eng. Schiappa de Azevedo partia para a ilha do Porto Santo com o objetivo de iniciar a arborização dessa ilha. A 15/11/1907 encontra-se publicado em diário que o Eng. Schiappa de Azevedo propunha o envio de árvores florestais e sementes de pinheiro para o Porto Santo. A 4/9/1912 encontra-se publicado em diário que o Eng. Schiappa de Azevedo reclamava das pastagens e da aridez dos terrenos do Porto Santo.”

Ao nosso leitor, Leonardo Reis, um grande bem haja.